Há pouco mais de 80 anos, a divulgação de um manifesto dava origem a uma das maiores agremiações políticas de que se tem registro no Brasil. Crítica ferrenha do comunismo e do capitalismo liberal — os quais consideravam “filhos do mesmo ventre” —, a Ação Integralista Brasileira (AIB) chegou a ter mais de 1 milhão de filiados na década de 1930, se intitulava como o único movimento realmente nacionalista no Brasil e por muito pouco quase elegeu um presidente.
Crítico do comunismo e do capitalismo liberal, o movimento chegou a ter 1 milhão de filiados na década de 30
Também conhecido como nacionalismo integral, o integralismo é uma doutrina política tradicionalista e extremamente conservadora, contrária às eleições e ao sistema de três poderes. Seus conceitos foram inspirados na Doutrina Social da Igreja Católica, elaborada no início do século 20. Entre vários aspectos, o integralismo defende o princípio de que uma sociedade só pode funcionar com ordem e paz, respeito das hierarquias sociais e fundamentada nas aptidões e nos méritos pessoais de seus indivíduos (em oposição a doutrinas igualitárias da Revolução Francesa, ao socialismo, comunismo e anarquismo), além da harmonia e união social.
O integralismo defende que cada nação precisa de um sistema político adequado à própria história, cultura, religião e pensamento. Dá prioridade à preservação da cultura local, da tradição, dos costumes e ao desenvolvimento das zonas rurais como forma de vencer o cosmopolitismo e o monoculturalismo. Os integralistas defendem uma forma de governo baseada na ligação do Estado com a família, defendendo princípios éticos, religiosos e morais.
O fundador do movimento no Brasil, Plínio Salgado, jornalista e filósofo com participação importante e influenciado pelo Movimento Modernista, redigiu em duas laudas de dez parágrafos os princípios básicos do Manifesto de Outubro, que condenava o materialismo, exaltava a influência de Deus e a necessidade de seguir os princípios cristãos. Católico conservador e de discurso messiânico, ele arregimentou multidões sob a promessa de que a “revolução interior” era o caminho da salvação e que o integralismo seria o caminho para a “assepsia das instituições”.
Entre personalidades, o escritor e compositor Vinícius de Moraes e o jurista Miguel Reale foram do movimento. No entanto, após o golpe de Getúlio Vargas, em 1937, a AIB foi dissolvida e atualmente apenas três grupos sobrevivem em todo o País.
Um deles fica em Campinas. Possui 33 integrantes, que se reúnem periodicamente, condenam a democracia, pregam o fim do voto, pedem a volta da família Real e “alertam” a respeito da “conspiração internacional” que seria engendrada pela seita milenar Iluminatti com objetivo de manipulação da sociedade por meio dos governos que, na verdade, serviriam apenas a seus interesses econômicos.
Líder
Cássio Guilherme Silveira, presidente do Movimento Integralista e Linearista Brasileiro (Milb), vive em Campinas, de onde comanda as ações do movimento. Seu discurso mantém os ecos de um passado pouco lembrado pela historiografia brasileira.
Cássio é servidor público federal e sobrinho de um ex-integrante da AIB que conheceu pessoalmente Plínio Salgado. Hoje, mantém um arquivo pessoal com livros e manuscritos de Plínio que servem de base de pesquisa para historiadores e de estudos para o grupo na cidade.
Ele conta que Campinas chegou a ter 35 mil filiados e foi um dos principais centros integralistas do País. De caráter ultraconservador, mas não xenófobo, de acordo com Cássio, o movimento condena o uso da figura do Papai Noel e pede o uso da figura do Vovô Índio. Diz que a família real portuguesa sofreu um “golpe” no Brasil e pede seu retorno.
Natural de Juiz de Fora (MG), Cássio criou o grupo há 10 anos em Campinas com outros dois advogados da cidade e diz que o movimento não tem ambições partidárias e que teria já inclusive sido procurado por políticos, mas se recusado a qualquer tipo de filiação. O movimento é contra a existência de partidos políticos. Atualmente, afirma Cássio, pretende apenas estudar a obra Integralista e atualizá-la aos tempos atuais.
Ele diz que o movimento não é contra os homossexuais, mas é contra o financiamento pelo Estado de marchas e campanhas, segundo ele, de apologia ao homossexualismo.
Defensor de que a Revolução Francesa é uma fraude e que a queda da Bastilha é uma fabricação burguesa, ele também diz que Karl Marx era um satanista financiado por um dos maiores capitalistas da época, Friederich Engels, e que os três poderes, conforme pensado por Montesquieu em O espírito das Leis, foram usurpados para destruir a sociedade. Além disso, a Inquisição da Igreja Católica também nunca teria existido.
Correio Popular, 06/01/2013.